Lula defende pauta social e questiona mercado por não incluir pobre na planilha

Em discurso no CCBB, Lula diz ser preciso priorizar medidas voltadas à população e reprova a “tal da estabilidade fiscal”. Investidores reagem mal à declaração. Simone Tebet defende que ministro da Fazenda seja o primeiro nome anunciado

A tempestade que desabou sobre a região central de Brasília, no fim da manhã de ontem, já estava prevista pela meteorologia e atrapalhou a festa preparada pela militância do PT para o primeiro dia de trabalho do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), onde funciona o governo de transição. Mas nem as trovoadas nem o estrondo da queda de uma grande árvore atrás do prédio projetado por Oscar Niemeyer provocaram mais ruído do que uma declaração do petista a parlamentares, logo em sua primeira agenda do dia, em que pôs em dúvida o compromisso do novo governo com a “tal da estabilidade fiscal” e com o teto de gastos.

“Por que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal deste país? Por que a toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gastos, que é preciso fazer superavit, que é preciso fazer teto de gastos? Por que as mesmas pessoas que discutem teto de gastos com seriedade não discutem a questão social neste país?”, disse Lula a deputados e senadores que foram ao CCBB para ouvi-lo.

A declaração foi dada no contexto da prioridade que Lula dá ao combate à fome. Ao falar que sua “missão estará cumprida” quando todos os brasileiros puderem fazer três refeições por dia, ele questionou a posição dos agentes de mercado, que não incluem as políticas sociais “às suas planilhas”.

No dia em que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) anunciou que a inflação voltou a ficar positiva — alta de 0,59% em outubro — depois de três meses de deflação, a fala do presidente eleito foi o combustível que alimentou o mau humor do mercado financeiro, que interpretou a declaração como uma flexibilização dos compromissos com a estabilidade fiscal assumidos pelo petista. O tempo fechou na Bolsa, que despencou 3,35%, enquanto o dólar encerrou o dia com alta de 4,14%.

Os políticos entraram em ação para amenizar os efeitos do que foi interpretado como um “escorregão perigoso” de Lula, segundo um aliado próximo. O vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, após anunciar novos nomes da equipe de transição, foi provocado pelos jornalistas a comentar as declarações do chefe. “O presidente Lula já foi presidente da República, assumiu o governo com uma dívida em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) de 60%. Quando transferiu o governo (para Dilma Rousseff), era menos de 40%. E teve superavit todos os anos. Se alguém teve responsabilidade fiscal foi o governo Lula. Isso não é incompatível com a questão social”, argumentou Alckmin.

No fim da tarde, o próprio Lula, ao deixar o CCBB, tentou minimizar a reação dos mercados à sua fala. “O mercado fica nervoso à toa, não vi o mercado tão sensível como o nosso. É engraçado que esse mercado não ficou nervoso durante (os) quatro anos (de governo de Jair) Bolsonaro”, ressaltou o petista enquanto cumprimentava militantes que o aguardavam desde o início da manhã.

Outras vozes influentes do partido fizeram coro na defesa do presidente eleito. “Não faz sentido pressões de fora definirem o que a gente vai fazer, ninguém vai querer mandar no governo de fora para dentro”, enfatizou ao Correio o líder do PT no Senado e membro do grupo de Saúde do governo de transição, Humberto Costa (PT-PE).

Para ajudar a conter especulações, a ex-candidata do MDB à Presidência, senadora Simone Tebet (MS), sugeriu em entrevista à Globonews que “o primeiro ministro a ser anunciado, no seu devido tempo e o mais rápido possível, seja o ministro da Fazenda ou da Economia, para que efetivamente o ministro possa explicar a política econômica do novo governo”.

Fonte: https://g1.globo.com/
Zeudir Queiroz

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