Vice-presidente da comissão, o senador Randolfe Rodrigues apresentará, nesta segunda (28/6), à Procuradoria, notícia-crime contra Bolsonaro por prevaricação no caso Covaxin. Na quinta, colegiado ouvirá sócio da Precisa Medicamentos, que intermediou o contrato
Embora as sessões da CPI da Covid só comecem na terça-feira (29/6), o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), já tem trabalho marcado para hoje. Ele vai registrar uma notícia-crime contra o presidente Jair Bolsonaro na Procuradoria-Geral da República por prevaricação. O depoimento ao colegiado do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, e do irmão dele, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), motivou o pedido de investigação. A dupla contou que procurou o chefe do Planalto para denunciar o acordo de compra superfaturada da vacina indiana Covaxin e diz ter ouvido dele que a Polícia Federal seria acionada para fazer a apuração, o que não ocorreu.
“Um servidor público concursado e seu irmão deputado federal levam ao presidente da República a notícia de um crime de corrupção em curso. O presidente informa que tem conhecimento do autor, que se trata do seu líder na Câmara dos Deputados. Mesmo comunicado, o presidente da República não toma nenhuma providência. Não instaura inquérito, não pede investigação, nada”, elencou Rodrigues, em vídeo. Ele se referiu ao fato de que Bolsonaro teria culpado o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Casa, pelo “rolo” do contrato. “Diante desse grave acontecimento, estarei representando, na segunda-feira, à Procuradoria-Geral da República, para dar notícia de crime de prevaricação cometido pelo senhor presidente da República. Esse crime, até aqui, é o mínimo a ser apurado. Tenho certeza que a CPI apurará muito mais além disso.”
Nesta semana, a CPI pode votar requerimento para a convocação de Barros. O líder do governo na Câmara já se disse à disposição para fazer esclarecimentos sobre o caso (veja na reportagem abaixo).
Também sobre o contrato suspeito da Covaxin, os parlamentares tomarão, na quinta-feira, o depoimento de Francisco Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, empresa que fez a intermediação da negociação do governo com o laboratório indiano Bharat Biotech, produtor do imunizante. Ele deveria ter sido ouvido na semana passada, mas alegou à CPI que estava em quarentena por ter viajado à Índia.
Integrante da comissão, o senador Otto Alencar (PSD-BA) afirmou ser importante para o colegiado aprofundar-se na relação da empresa com o Ministério da Saúde. “A Precisa está atuando para vender medicamentos, como já vendeu preservativo. O dono, Maximiano, é sócio da Global, que deu calote (na pasta) quando Ricardo Barros era ministro (da Saúde). Ele era um contumaz empresário enrolado e entrou nessa possibilidade de venda da Covaxin”, ressaltou. “As provas mostram que teve ajuda do governo, começando pelo ex-ministro Ernesto Araújo (que comandou a pasta das Relações Exteriores), que fez advocacia administrativa junto ao governo indiano.”
A vacina foi comprada por US$ 15 a dose, preço mais caro entre os imunizantes adquiridos pelo governo. “O caso é muito grave. Se os irmãos falaram com o presidente, ele disse que ia encaminhar para a Polícia Federal e não encaminhou, isso tem de ser apurado. Os irmãos Miranda confirmaram tudo, mostraram tudo e deram o nome do Ricardo Barros, que precisa ser ouvido”, enfatizou. “A CPI deve ser prorrogada. Vamos aprovar novos requerimentos de convocação, incluindo o de Ernesto Araújo. O fatos mostram um tráfico de influência, o governo atuou para beneficiar a Precisa.”
Nova vertente
Na avaliação do senador Rogério Carvalho (PT-SE), os trabalhos entraram em uma nova frente. “A minha impressão é de que a CPI concluiu uma etapa, que foi de caracterizar os crimes sanitários e contra a vida. Sexta-feira, a gente já entrou na nova etapa, que é para saber se, na compra de insumos, houve desconformidades. Se houve desconformidades na compra de vacinas, de medicamentos. Está claro que teve desconformidade. Tem processos fora da regularidade. E precisamos aprofundar o caminho”, destacou. “Vamos continuar na linha para a caracterização dessa nova vertente que se abriu com o surgimento do nome do deputado Ricardo Barros. O caminho não é a Precisa, mas qual a interferência do Ricardo Barros e o que ele representa de rede de negócios no governo.”
O senador governista Carlos Heinze (PP-RS) discordou. “Estão buscando chifre em cabeça de cavalo. Esse deputado brasiliense que foi ouvido é fake. Esse negócio da Precisa não tem nada a ver. Foi normal”, refutou. Para ele, o depoimento mais esperado da semana será o do deputado amazonense Fausto Vieira (PRTB), relator da CPI que investiga o governador do estado, Wilson Lima, marcado para amanhã. “Vamos ver a questão do Amazonas, o que mais pode trazer.”
Na quarta-feira, a CPI tomará o depoimento do empresário Carlos Wizard. Ele é considerado um dos financiadores do gabinete paralelo, grupo que municiava Bolsonaro com informações negacionistas sobre a crise sanitária. Nesta semana, também, a comissão deve avaliar se prorrogará os trabalhos, previstos para serem encerrados na primeira semana de agosto.
“Estão buscando chifre em cabeça de cavalo. Esse deputado brasiliense que foi ouvido é fake. Esse negócio da Precisa não tem nada a ver. Foi normal”
Carlos Heinze (PP-RS), senador governista
Prejuízo milionário
A Global Saúde — do mesmo grupo da Precisa Medicamentos — não honrou um contrato fechado com o Ministério da Saúde, na época em que Ricardo Barros comandava a pasta, causando prejuízo de R$ 20 milhões aos cofres públicos, como já apontado pelo Ministério Público Federal (MPF).
Miranda relata perseguição
O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) afirmou, ontem, que o Ministério da Saúde bloqueou o acesso de seu irmão, Luis Ricardo Miranda, ao sistema da pasta. O servidor é funcionário de carreira do ministério. Os dois denunciaram irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin pelo governo.
“Aos defensores de bandidos, meu irmão acaba de descobrir que bloquearam ele do sistema”, escreveu o deputado no Twitter. “Vale ressaltar que ele é funcionário de carreira! Isso é ilegal, perseguição e só comprova que eles têm muito para esconder…” A reportagem questionou o Ministério da Saúde sobre o suposto bloqueio do servidor, mas não havia resposta até o fechamento desta edição.
Nos últimos dias, Miranda já vinha acusando o governo de perseguição em razão das denúncias. No sábado, ele disse que sofreu retaliação do próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Citou o fato de Lira ter anunciado, enquanto ele dava depoimento à CPI da Covid, na sexta-feira, os nomes dos deputados Luiz Carlos Motta (PL-SP) e Celso Sabino (PSDB-PA) como relatores dos dois textos que compõem a reforma tributária. De acordo com Miranda, a relatoria da proposta estava prometida a ele.
Também no sábado, o parlamentar reclamou que ele e o irmão seguiam “sem proteção nenhuma”, apesar das ameaças feitas por simpatizantes do governo em redes sociais após as denúncias.
Miranda já deu indicações de que pode existir uma gravação que comprova que o presidente Jair Bolsonaro foi informado sobre o suposto esquema no Ministério da Saúde. Segundo ele, se o chefe do Planalto desmenti-lo, terá uma “surpresa mágica”.
À comissão, os irmãos disseram ter avisado a Bolsonaro, há três meses, sobre as suspeitas e sobre uma “pressão atípica” para acelerar a importação da vacina. O presidente teria citado o deputado federal Ricardo Barros (Progressistas-PR), líder do governo na Câmara, como o parlamentar que queria fazer “rolo” no ministério.
Barros: “Não há envolvimento meu no contrato”
O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), voltou a negar, ontem, qualquer envolvimento no contrato firmado pelo governo federal para a aquisição da vacina Covaxin. Em depoimento à CPI da Covid, na sexta-feira, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) disse que o presidente Jair Bolsonaro atribuiu a Barros a responsabilidade por eventuais irregularidades no processo de compra do imunizante.
Segundo Barros, a conversa relatada na CPI por Miranda seria sobre um processo judicial do tempo em que era ministro da Saúde. “Do ainda impreciso diálogo com o presidente da República, na transcrição da CPI, o caso em questão seria sobre a empresa Global e a compra de medicamentos não entregues. Trata-se de um processo judicial, em que provo a conduta em favor do SUS (Sistema Único de Saúde), quando fui ministro da Saúde”, frisou em nota e em postagens no Twitter.
O presidente da Global Saúde é o empresário Francisco Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, responsável por intermediar a compra da Covaxin pelo Brasil. A Global já foi alvo de ação por irregularidade em contrato com o Ministério da Saúde, em 2018, à época em que Barros era ministro. Na ocasião, a pasta pagou R$ 20 milhões por remédios de alto custo, mas os produtos nunca foram entregues.
“Embora a Global seja sócia da Precisa Medicamentos, em análise pela CPI, esse processo em nada se relaciona com a aquisição de vacinas da Covaxin. Não participei de qualquer negociação para a compra desse produto”, enfatizou Barros.
O líder do governo disse ser “evidente que não há dados concretos ou mesmo acusações objetivas” contra ele, inclusive pelas entrevistas dadas, no fim de semana, pelos irmãos Miranda, numa referência ao deputado Luis Miranda e seu irmão e servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda.
“Reafirmo minha disposição de prestar os esclarecimentos à CPI da Covid e demonstrar que não há qualquer envolvimento meu no contrato de aquisição da Covaxin”, destacou o líder do governo.
Barros reafirmou que não foi sua a indicação da servidora Regina Célia para o cargo no Ministério da Saúde. A funcionária foi apontada na CPI como indicada de Barros ao posto. Ela teria dado aval para a negociação com o imunizante indiano. “Ela é servidora concursada desde 1995, não podendo haver escolha ou não de sua participação na rotina do Ministério da Saúde. Ocupou mais de cinco cargos de livre nomeação em quatro gestões presidenciais anteriores ou ao longo do período de seis ministros da Saúde ao longo de sua carreira”, ressaltou.
O deputado ainda esclareceu que sua defesa pública em favor de mais agilidade por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da oferta de imunizantes e produtos para o combate à covid seria uma obrigação como ex-ministro da Saúde, além do fato de ser presidente da Frente Parlamentar da Indústria Pública de Medicamentos desde 2015.
Sobre a emenda, de sua autoria, à medida provisória que viabilizou a importação da Covaxin, Barros lembrou que o “tema foi motivo de emendas de oito parlamentares, entre eles, o presidente da CPI da Covid, Omar Aziz”. “O Legislativo deve fazer sua parte para o acesso às melhores práticas e benefícios e ampliação do atendimento à população. Reitero que sempre busquei a transparência e o diálogo na minha vida pública e me coloco à disposição para quaisquer esclarecimentos à apuração da CPI.”
Fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/
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