Operações do MPCE não barram candidaturas no Ceará

Cercada de processos, a procuradora de Justiça Vanja Fontenele contabiliza 694 demandas de investigações à Procap desde janeiro deste ano ( Foto: José Leomar )
Cercada de processos, a procuradora de Justiça Vanja Fontenele contabiliza 694 demandas de investigações à Procap desde janeiro deste ano ( Foto: José Leomar )
Mesmo na mira de investigações do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) pela prática de atos ilícitos contra o patrimônio público, nomes que ocupam ou já ocuparam cargos de prefeito e vereador em cidades cearenses devem estar nas urnas, aptos a receberem votos, na eleição de outubro próximo. Alguns que já foram, inclusive, denunciados criminalmente à Justiça, estão com candidatura deferida por juízes eleitorais, enquanto que outros, indeferidos, aguardam análise de recurso. Casos assim têm vindo à tona da Capital ao Interior. Alvo de operação da Procuradoria dos Crimes contra a Administração Pública (Procap), do MPCE, em 2013 por fraudes em licitações, o atual prefeito do município de Quixeramobim, Cirilo Pimenta (PDT), de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), já teve pedido de registro de candidatura deferido por juiz eleitoral e disputa reeleição. Quase 220 quilômetros distante dali, em Itaiçaba, investigação do MPCE apontou, no mesmo ano, indícios de crimes de desvio de verbas públicas na gestão do ex-prefeito Frank Gomes (PDT), que lançou-se candidato mais uma vez e aguarda análise do pedido de candidatura. Em Juazeiro do Norte, o atual prefeito, Raimundo Macêdo, que é chamado de Raimundão (PMDB), foi enquadrado na Lei da Ficha Limpa e, por isso, teve sua candidatura indeferida pela Justiça Eleitoral. Na tentativa de disputar reeleição, no entanto, interpôs recurso contra decisão e aguarda julgamento. Na mais recente ação do MPCE contra ele, foi denunciado, com seu ex-secretário de Saúde da cidade, José Damásio Soares Costa, por fraude em dispensas indevidas de licitações. Tal denúncia, que data de junho, não é a primeira. Coordenadora da Procap, a procuradora de Justiça Vanja Fontenele diz que, como cidadã, fica “frustrada” com o aceite de candidaturas de investigados por ilicitudes na gestão da coisa pública, mas garante que, como instituição, a Procuradoria não alimenta qualquer sensação de impunidade diante da falta de punição destes postulantes com vistas ao pleito de outubro. “Eu, como cidadã, me sinto frustrada, mas, como membro do Ministério Público e coordenadora da Procap, a sensação é de que meu trabalho vai aumentar e eu preciso trabalhar mais, então não posso me desalentar de forma nenhuma. Preciso encontrar formas de seguir nesse combate rotineiro e constante à corrupção”, afirma. Funções Ela explica, ainda, que não está na alçada da Procap a tomada de medidas práticas contra tais candidaturas, uma vez que barrá-las cabe à Justiça Eleitoral. “Há a Justiça Comum, que apura os crimes pelos quais processamos os agentes públicos, e a Justiça Eleitoral, que tem a avaliação dela”, diferencia. A atuação da Procuradoria está, ainda que indiretamente, no diálogo mantido com os promotores eleitorais, que, neste ano, são 123. São eles que podem ajuizar impugnações de candidaturas e, para isso, utilizam, por vezes, das apurações de crimes contra a administração pública. “Muitos nos indagam sobre esses prefeitos, mas da grande maioria dos nossos processos os colegas no Interior têm conhecimento, principalmente das operações, porque a gente sempre faz a comunicação e os colegas nos acompanham”, diz. “Eles sabem o que está acontecendo, e muitos impugnaram candidaturas. Houve pedidos de impugnação das candidaturas, mas as decisões não estão nas mãos do Ministério Público, estão nas mãos dos membros do Poder Judiciário, então foram ao contrário dos alertas de impugnação”, acrescenta Vanja Fontenele. Novas demandas Enquanto isso, novas demandas de investigações não param de chegar à Procap. De janeiro ao início de setembro, segundo a coordenadora do grupo, foram 694. O número de operações chega a 20. São investigações que abrangem municípios como Barreira, Quixadá, Várzea Alegre, Ererê, Juazeiro do Norte, Tururu, Solonópole, Redenção e outros. Um dos prefeitos que são alvos de investigação, relata Vanja Fontenele, já acumula seis processos; em três está denunciado criminalmente à Justiça. “Tem um desses prefeitos que está denunciado três vezes, em três crimes cujo objeto é o mesmo: fraude em licitação. E isso termina em benefício dele próprio, então é frustrante você verificar que essa pessoa é candidata de novo, ou seja, vai continuar fazendo o que está fazendo, se ganhar”, aponta. O nome do gestor ela não revela porque algumas das investigações contra ele correm em segredo de Justiça. Câmara Municipal A situação se repete, também, entre candidatos a vereador. Em Fortaleza, Leonelzinho Alencar (Pros), que renunciou à cadeira que ocupavam na Câmara Municipal da Capital dias antes da abertura de processo de cassação do seu mandato, em 2013, teve candidatura deferida pela Justiça Eleitoral mesmo após ter a postulação questionada pelo Ministério Público Eleitoral. Em 2013, 30 mandados de busca e apreensão foram cumpridos no gabinete e na residência do então vereador, no Instituto Jáder de Alencar e na residência de funcionários e parentes do político. De acordo com a Procap, a ação investigou suposto desvio de verba destinada ao Instituto para fins sociais que acabava sendo usada para publicidade do mandato de Leonelzinho. Outra operação, denominada “Vespeiro”, apurou, em agosto de 2014, denúncias de desvios de recursos da Verba de Desempenho Parlamentar (VDP) do então vereador Antônio Farias de Sousa (PTB), o “Aonde É”. Ele teve pedido de registro de candidatura negado por descumprimento da Lei da Ficha Limpa, mas interpôs recurso e aguarda julgamento por instância superior, segundo dados do Sistema de Divulgação de Candidaturas do TSE (Divulgacand). Vanja Fontenele sustenta, contudo, que o deferimento de candidaturas de investigados pelo MPCE não é reflexo da morosidade na tramitação dos processos contra agentes públicos após as operações, mas sim resultado de uma interpretação da Lei da Ficha Limpa. “Está na questão das interpretações das impugnações, em relação a esse tipo de candidato lá no TRE. Quando eu fiz concurso para o Ministério Público, um dos requisitos era que estivesse limpa no Fórum Criminal, na Justiça Federal e na Justiça Estadual”, lembra, comparando: “Então eu não consigo entender como é que a Justiça Eleitoral aceita uma pessoa sobre quem pairam inúmeros processos para que possa representar o povo”. Fique por dentro Grupo de auxílio a promotores aguarda criação Um grupo de auxílio aos promotores de Justiça que atuam no Interior do Estado em investigações de ilicitudes contra o patrimônio público deve ser criado na estrutura do MPCE. Vanja Fontenele, coordenadora da Procap, adianta que o Núcleo de Combate à Corrupção na Administração Pública (Nucap) já tem minuta elaborada e aguarda assinatura do procurador-geral de Justiça, Plácido Rios, mas sua instituição esbarra em limitações orçamentárias e de pessoal. “Envolve a atuação criminal e da improbidade, porque antes era só da improbidade, e a improbidade é a recuperação do erário, a restituição do que foi retirado, e o crime vai se punir, com pena de prisão”, detalha. O Nucap também é resposta a uma demanda de promotores, que relatam dificuldade em acompanhar processos diante de deficiências de caráter estrutural no MPCE. Contudo, ainda não tem data para ser criado, pois, conforme Deolinda Noronha, promotora de Justiça e membro da Procap, o núcleo demanda um aporte financeiro e de pessoal. “Estamos passando um momento de limitação orçamentária, não só do Ministério Público, mas do próprio Estado do Ceará, então não tem como ser automático assim. Se dependesse apenas da vontade do procurador-geral, esse grupo certamente já estaria em funcionamento”, justifica. Fonte: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/
Zeudir Queiroz

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