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MEU TIPO INESQUECÍVEL -XXVI

Menino travesso da famigerada Braga Torres, descendo e subindo ladeiras do Morro Santa Terezinha, jogando pelada nos areais do Pirambu, enquanto a mãe lavava roupa num riachinho ali perto (ainda não esgoto a céu aberto) em companhia da mãe do colega de presepada Chico Lopes, sim, esse mesmo, o atual deputado federal. O pai, motorneiro dos bondes da velha Light queria um futuro digno para o pirralho, portanto mantinha-o sob as asas vigilantes, levando-o constantemente no seu moderno transporte coletivo. Ainda menor de idade foi colocado na empresa onde veio a ser depois leiturista, já na Conefor, ex Serviluz, atual Coelce. E assim foi levando a vida, entregando contas rabiscadas à mão e conferindo registros de consumo de energia no centro comercial, quando fez boas amizades com empresários de todas as atividades e diferentes níveis financeiros.

Frequentador dos bares do centro velho da cidade, a par de suas tarefas na companhia de força fazia alguns bicos na imprensa por conta das amizades e da proximidade dos grandes jornais, todos situados no perímetro central da emergente metrópole que chegava à casa do seu meio milhão de habitantes. Assim, O POVO e os Diários Associados tinham sede na rua Senador Pompeu; O Estado, na Praça José de Alencar; Tribuna do Ceará, das Classes Produtoras, na 24 de maio; Gazeta do Notícias na Praça Clovis Beviláqua, embaixo da Rádio Uirapuru; O Jornal, dos Bonaparte Maia e O Nordeste, da Arquidiocese, na Cidade da Criança… e mais Diário do Povo, do Jáder de Carvalho e A Fortaleza, também do Arcebispado, todos inscritos no quadrilátero traçado por Silva Paulet, Duque d Caxias, Imperador. Dom Manuel e Castro e Silva. Até que findou por integrar a equipe da Revista dos Municípios, dirigida por Américo Barreira.

Certa vez Américo mandou-o em missão a Salvador e, após memorável carraspana, já de volta sem ter cumprido o dever, descendo as ladeiras baianas, deu de cara numa placa de rua com um vistoso “Américo Barreira”. Incontinenti, fotografou. Foi a salvação, o tal nome de rua era nada menos que o batismo feito homenagem ao avô paterno do grande municipalista que, muito grato, perdoou, mais uma vez, o deslize de seu diligente funcionário.

Aposentado há anos, nunca deixou de flanar pelos antigos quarteirões da cidade que ama, almoçar nos últimos restaurantes populares um comercial de bolinhas, bater um papo com os poucos conhecidos que restam. Saudades ao passar pelas calçadas da Guarany, Monte Carlo, Império, Fascinação e outras pensões alegres, não tão familiares; o Clube do Sargento das famosas vesperais domingueiras, o lendário Senadorzão. Festeiro, foi por longos anos frequentador do Oásis e de todos os clubes suburbanos chegando a ser diretor social do Comercial Clube, na Praia de Iracema, ao tempo de José Cláudio de Oliveira e Expedito Carneiro.

Não perde tempo, faz cursos de redação, prestigia eventos culturais, participa de congressos nem que seja pela boca livre e dá plantões nos jornais e associações de classe e pertence aos quadros da ACEJI (Associação Cearense dos Jornalistas do Interior) embora fortalezense da gema. Ah, sim, é decano do Clube do Bode, assinou a primeira ata dez anos atrás, é um dos mais assíduos frequentadores, se bem que passe a maior parte do tempo entregue aos braços de Morfeu.

No passado foi figura onipresente na Praça do Ferreira e todos tinham-no como sósia do ator ítalo-americano Ernest Borgnine: alto, espadaúdo e elegante. Não perdeu a pose e, apesar de alquebrado pelos janeiros veste-se, com discrição, à moda antiga, coerente com seu perfil: roupas em tons neutros, pendendo para o marrom, tal a farda do pai. Mas o sorriso sempre aflora e é um bom papo, principalmente quando recorda momentos felizes com os companheiros de jornada Luciano Barreira, Odalves Lima, que já se foram; e Teixeira Cruz, Inácio de Almeida, Gervásio de Paula, Paulo Verlaine, que ainda estão em nosso convívio. Afora toda a comunidade caprina, onde vez por outra relembra os tempos antigos, apaixona-se como um colegial, anda sonhando acordado com uma distinta senhora, o que mais lhe alarga o sorriso.

Este é o jornalista Antonio Saraiva de Almeida Filho, hoje, meu tipo inesquecível.
Jornal O Povo dia 23-02-2012

CLUBE DO BODE

O jornalista Antônio Saraiva, 76, morreu na última terça-feira de infecção generalizada. Participante da boemia cearense e decano do Clube do Bode, ele frequentava o Flórida Bar desde a fundação. “Estava sempre com um sorriso largo e contando histórias”, relembra o amigo e presidente do Clube do Bode, Sérgio Braga. O enterro foi no São João Batista.
Da Coluna Vertical do Jornal o Povo \- 23-02-2012

Zeudir Queiroz