Resolvi escrever sobre este tema tão polêmico por sugestão do blogueiro Wanfil. Costumo evitar os territórios dos debates infrutíferos, mas como acho que é possível chegar a uma conclusão coerente, em se falando de regressão a supostas vidas passadas, sem ferir a crença ou descrença de quem quer que seja, resolvi aceitar o desafio e aqui estou.
PORQUE REGRESSÃO ÀS VIDAS PASSADAS É UM TEMA INTRIGANTE
Regressão de memória a vidas passadas é um tema intrigante por fomentar questões existenciais que nos fazemos desde as eras remotas: “De onde viemos? Para onde vamos? Por que estamos aqui?”
É verdade que já faz algum tempo que a Ciência negou-se a examinar tais perguntas, relegando-as ao domínio da Filosofia e da Religião. Entretanto, uma verdadeira revolução paradigmática, encabeçada pela Física Quântica, tem recuperado as reflexões existenciais como objeto dos meios científicos. Mas este é um movimento recente e, quando o assunto envolve regressão de memória a vidas passadas, ainda há muito preconceito a ser enfrentado.
A discriminação acerca deste tema deve-se principalmente ao fato de as vidas passadas pertencerem mais ao escopo das tradições espirituais que ao da pesquisa acadêmica propriamente dita. Mesmo assim, nos meios científicos, há pesquisadores que enveredam na investigação da possibilidade literal da reencarnação, como Yan Stevenson, autor de Twenty Cases Suggestive of Reincarnation e, mais recentemente, Amit Goswami, que no seu livro Physics of the Soul.
TRABALHAR COM VIDAS PASSADAS NÃO EXIGE CRER EM REENCARNAÇÃO
Mas independente de ser comprovada ou não da reencarnação, é possível trabalhar com regressão de memória a vidas passadas. Basta simplesmente assumir que, para fins terapêuticos, não interessa comprovar a multiplicidade das existências. Não é este o papel de um terapeuta. O objetivo maior de uma terapia, afinal, é ajudar o cliente, e não resolver o problema filosófico da existência humana. Segundo o terapeuta junguiano de Oxford, Dr. Roger Woolger (2008):
“Quando uma memória de vida passada é evocada ou ocorre espontaneamente na terapia, não a vejo como um fim em si mesma, mas apenas como um meio que pode favorecer a catarse emocional, a auto-compreensão e a cura que, em minha opinião, são os verdadeiros objetivos da terapia.”
Mesmo assim, não é tão simples separar posturas profissionais de convicções pessoais. Naturalmente pessoas que acreditam em reencarnação vêem-se mais propensas a trabalhar com regressão de memória a vidas passadas. Porém é possível guiar-se, para explicar o fenômeno de lembrança de outras vidas, pela hipótese junguiana de que somos todos capazes de mergulhar nas memórias coletivas da humanidade e que as recordações mencionadas não são mais que experiências deste tipo. Por outro lado, nada nos impede também, ainda citando Woolger, de “abraçar a reencarnação em toda sua sublime simplicidade”.
A VERDADE PSÍQUICA É O INSTRUMENTO DE TRABALHO DO TERAPEUTA
Permanece então a dúvida no campo da verdade literal das vidas passadas, mas não a respeito da verdade do fenômeno denominado regressão a vidas passadas. Segundo Dr. Woolger, “para o terapeuta há um outro tipo de verdade, a verdade psíquica: aquilo que é real para o paciente.” Ou, como diria o psiquiatra suíço Carl G. Jung (2008):
“Para o psicólogo, nada há mais estúpido do que o ponto de vista do missionário que declara ilusórios os deuses dos pobres pagãos. No entanto, infelizmente, hoje ainda se costuma dogmatizar, como se aquilo que chamamos realidade também não fosse ilusório. No domínio psíquico, como na experiência em geral, realidade são os fatores eficazes.” (grifo meu).
Portanto, quando perguntam, a respeito da regressão de memória a vidas passadas, se é realidade ou fantasia, não constituirá um contrassenso responder: as duas coisas. Por que, enfim, o que no faz acreditar que o que denominamos realidade não é, na essência, uma fantasia?
Citações:
WOOLGER, Roger. As várias Vidas da Alma. São Paulo, Cultrix, 2008.
JUNG, Carl. Ab-reação, Análise dos Sonhos, Transferência. Petrópolis, RJ. Vozes, 2008.
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