Quando o problema começa a impactar negativamente a vida da pessoa, é necessário buscar ajuda
Beber água, conversar com os amigos, tomar remédio e lembrar de compromissos são atividades corriqueiras no dia a dia da maioria da população, só que, hoje em dia, as pessoas dependem da ajuda dos seus smartphones até para realizar essas tarefas. Porém, a dependência desses aparelhos para os mais diversos hábitos pode influenciar negativamente no comportamento do usuário.
Fazer ligações é raridade para muitos usuários de smartphones. Eles preferem acessar as redes sociais e utilizar diversos aplicativos Foto: Fabiane de Paula
A estudante de psicologia, Ana Guimarães, se considera totalmente dependente do seu smartphone. “Quando fico muito tempo sem usá-lo acabo sentindo muita falta”, explicou. Um dia, por exemplo, ela saiu de casa, mas esqueceu o celular. Mesmo estando na metade do caminho ela não pensou duas vezes e saiu do ônibus em que estava e voltou para a sua residência. “Eu não consegui me imaginar passando a manhã toda sem o meu telefone”, afirmou.
Entre os aplicativos mais utilizados por Ana está o que a avisa quando deve tomar o seu remédio. “Antes de baixar esse aplicativo eu sempre acabava me esquecendo de tomar o medicamento”, ressaltou.
Fazer ligações ou enviar SMS são uma raridade na vida da estudante de design de moda, Clara Nogueira. Desde que ela começou a usar o seu smartphone aplicativos como Facebook, Instagram, WhatsApp e Pinterest fazem parte do seu dia a dia. “Ligações e mensagens são raras”.
Além disso, o seu aparelho lhe lembra, a cada duas horas, que deve beber uma certa quantidade de água para que possa continuar hidratada. Outro aplicativo ajuda a estudante de design de moda a catalogar as peças do seu guarda-roupa.
Se esse comportamento se tornar excessivo ele pode afetar a saúde física e emocional, afirmou a psicóloga colaboradora no Núcleo de Dependência Tecnológica do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo (IPq/FMUSP), Sylvia van Enck. “Estudos indicam problemas posturais, de visão, transtornos alimentares, distúrbios gastrointestinais, a rotina da pessoa pode ficar comprometida e as relações familiares e sociais também sofrem por este abuso da tecnologia”
Porém, a psicóloga ressalta que o maior perigo dessa dependência reside no fato de que a pessoa tende cada vez mais a abandonar sua vida real para permanecer conectado.
Sylvia alerta para o fato de que se o problema não for tratado as pessoas terão muitas dificuldades nas relações presenciais, comprometendo a comunicação e a saúde. “É fundamental a busca de ajuda de um profissional”, alertou.
Fluxo de informação
Para o mestre em comunicação e pesquisador em apropriação de mídias digitais e suas relações com a cidade, Cesar Silva, hoje as pessoas utilizam muito smartphones e também outras tecnologias porque antes as mídias tradicionais não forneciam o mesmo fluxo de informação. Portanto, desde o surgimento da Web 2.0 as pessoas sentem vontade de se conectar mais, criar em maior quantidade e isso aumentou o fluxo de informação. “Hoje estamos suprindo o que estava faltando”, disse.
Silva não acredita que as interações sociais entre as pessoas tenham mudado devido a essa tecnologia, mesmo ela dando a impressão de que estamos mais próximos. “Muitas pessoas pensam que Orkut e Facebook são redes sociais, mas essas são apenas plataformas. As redes sociais são as pessoas”.
Segundo o coordenador de cultura digital da Rede Cuca, Paulo Amoreira, se a utilização do smartphone se configura em recorrência de excessos, frustração, ansiedade e compulsões, é preciso considerar que a pessoa precisa de ajuda, já que está usando essas tecnologias para tentar lidar com questões de outra ordem. “Não é a coisa em si que vicia. O indivíduo é que apresenta um potencial de se viciar”, comentou Amoreira.
Ele acredita que os excessos de compartilhamento podem acabar distanciando a pessoa da experiência que ela está vivenciando. O exemplo usado pelo coordenador são aqueles fãs que vão para os shows e se focam mais em tirar fotos e fazer vídeos, para compartilhar, do que em aproveitar aquele momento. “Assim uma hiperconexão on line pode provocar uma desconexão local”, frisou.
Pais devem controlar uso pelos filhos
Os dispositivos tecnológicos não chamam a atenção apenas dos adultos, mas também das crianças, que se encantam com os diversos tipos de aplicativos e jogos. Mas esse uso precisa ser moderado, já que o excesso pode causar alterações no desenvolvimento dos pequenos.
Devido à interação, os dispositivos tecnológicos chamam a atenção da criançada, que se encanta com os aplicativos e jogos. Mas o uso precisa ser moderado, pois o excesso pode causar alterações no desenvolvimento dos pequenos
Desde que comprou o seu tablet, a arquiteta Rosana Leitão tem dividido o aparelho com o seu filho, Marcel, de apenas três anos. “Sempre prefiro que ele brinque com outras coisas e também com outras crianças. Mas ele gosta tanto que sempre acabo cedendo um pouco”.
A arquiteta tem medo de que o seu filho fique viciado nessa tecnologia e assim deixe de fazer novas amizades. “Uma criança não pode ficar o dia todo olhando apenas para uma tela de um tablet. É importante correr, pular e se socializar”.
Dessa forma a mãe do Marcel procura impor limites para o uso dessas novas tecnologias. Todos os dias, o pequeno pode ficar no máximo meia hora utilizando o tablet. Porém, durante o dia, ele acaba ficando mais tempo em frente à televisão.
Desenvolvimento
Segundo a fonoaudióloga especialista em desenvolvimento infantil, Ana Cristina Vieira, as crianças de até três anos estão no período onde a velocidade de desenvolvimento da plasticidade cerebral é grande e, por isso, precisam desenvolver todas as áreas, como a motora, linguagem, social e emocional.
Portanto, se o pequeno acaba ficando várias horas na frente do tablet ou TV, por exemplo, ele vai desenvolver apenas o estimulo visual, auditivo e congênito. “Essas crianças não conhecem vários tipos de textura, não andam e tem privações sensoriais”, explicou a fonoaudióloga.
Devido a esse tipo de educação esses pequenos tem dificuldades de se relacionar com outras pessoas. Eles não sabem se expressar e, dessa forma, acabam se isolando. “Elas tem problemas até para brincar com outras crianças”.
A dificuldade em se comunicar, não olhar no olho dos outros e o isolamento das crianças que convivem horas com essas novas tecnologias geralmente podem parecer com espectro autista, alertou Ana Cristina. “A educação que essas crianças receberam, através de várias horas em frente ao tablet, pode causar tantas alterações no seu desenvolvimento que é possível confundir o seu comportamento com o de um autista”, afirmou a especialista em desenvolvimento infantil.
THIAGO ROCHA
REPÓRTER
Diário do Nordeste
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