Eleições 2024

Cidades brasileiras transformam lixo em biogás para gerar energia e reduzir poluição

Foto: Reprodução

Diante do crescente problema do descarte de lixo no Brasil, algumas cidades têm investido em soluções inovadoras e sustentáveis para minimizar os impactos ambientais. Fortaleza (CE) e Seropédica (RJ) estão entre os municípios que apostaram na conversão de resíduos orgânicos em biogás, uma alternativa renovável para a produção de energia.

No Ceará, o projeto de geração de biogás foi iniciado em 2018, permitindo que o lixo domiciliar de Fortaleza e Caucaia fosse transformado em gás combustível. A usina GNR, responsável pelo processo, capta e trata os resíduos coletados no Aterro Municipal Oeste de Caucaia. De acordo com Hugo Nery, diretor-presidente da Marquise Ambiental, a iniciativa já permite a produção de biometano a partir de seis mil toneladas de lixo coletadas diariamente.

No Rio de Janeiro, um modelo semelhante já opera na cidade de Seropédica, onde a empresa Gás Verde transforma resíduos do maior aterro sanitário da América do Sul em biogás. O processo permite a captura de metano, um gás 27 vezes mais poluente que o CO₂, reduzindo significativamente o impacto ambiental.

Como funciona a geração de biogás?

A produção de biogás ocorre a partir da decomposição da matéria orgânica presente nos resíduos domiciliares. O lixo coletado é depositado em aterros sanitários estruturados, onde ocorre a fermentação anaeróbica (sem oxigênio). Nesse ambiente, bactérias degradam os resíduos, gerando o biogás, composto predominantemente por metano e dióxido de carbono.

Para ser aproveitado como fonte de energia, o biogás pode ser:

  • Utilizado diretamente em turbinas para geração de eletricidade.
  • Purificado para remover CO₂ e contaminantes, resultando no biometano, um combustível renovável semelhante ao gás natural.

O biometano pode ser utilizado por indústrias, comércios e até veículos, sem necessidade de adaptações. No Ceará, 15% do gás consumido já vem do aterro sanitário de Caucaia, e a tendência é de crescimento.

Benefícios ambientais e energéticos

A transformação de lixo em biogás é uma das alternativas mais eficazes para o combate às mudanças climáticas e a sustentabilidade energética. Entre os benefícios estão:

Redução de emissões de gases do efeito estufa: a captação de metano evita sua liberação direta na atmosfera.
Alternativa ao gás natural: o biometano pode substituir combustíveis fósseis, reduzindo a dependência do petróleo.
Diminuição da poluição do solo e da água: evita a contaminação por chorume, um líquido tóxico gerado pela decomposição do lixo.
Geração de energia renovável: abastecimento de redes de gás, frotas de veículos e produção industrial.

Além disso, especialistas como Mona Lisa Moura, professora da Universidade Estadual do Ceará (UECE), destacam que o Brasil tem grande potencial para expandir a produção de biogás, especialmente devido à agricultura e pecuária, que geram toneladas de resíduos orgânicos anualmente.

Por que o modelo ainda não se expandiu no Brasil?

Apesar dos benefícios, a expansão do biogás ainda enfrenta desafios estruturais e regulatórios. Segundo a Associação Brasileira do Biogás e do Biometano (Abiogás), o Brasil poderia produzir 120 milhões de metros cúbicos de biometano por dia, volume suficiente para substituir até 70% do diesel consumido no país. No entanto, existem obstáculos que dificultam essa implementação em larga escala:

🔴 Falta de infraestrutura: a conversão de biogás em biometano exige investimentos em dutos e usinas especializadas.
🔴 Coleta e separação inadequadas: muitos municípios ainda descartam resíduos misturados, reduzindo o aproveitamento da matéria orgânica.
🔴 Concentração dos gasodutos no litoral: cidades do interior enfrentam dificuldades para distribuir o gás.
🔴 Burocracia e regulação insuficiente: ausência de políticas públicas que incentivem o biometano como combustível renovável.

Segundo Marcel Jorand, CEO da Gás Verde, muitos estados ainda estão apenas iniciando a discussão sobre o biogás. No entanto, o setor tem grande potencial de crescimento, com um mercado estimado em bilhões de reais.

Comparação com outros países

Enquanto o Brasil ainda dá os primeiros passos na transformação do lixo em energia, países como Alemanha e Estados Unidos já adotam essa prática em larga escala.

  • Alemanha: 99% dos aterros captam metano para gerar energia, e o país tem uma taxa de reciclagem de 67%.
  • Estados Unidos: aterros sanitários abastecem redes de gás natural e frotas de caminhões.

Para que o Brasil alcance esse nível, será necessário fechar os lixões a céu aberto e investir em gestão de resíduos moderna e sustentável.

O problema do lixo no Brasil

Atualmente, apenas 58,5% do lixo urbano no Brasil é destinado a aterros sanitários regulamentados, conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). O restante ainda é descartado em lixões ou locais inadequados, gerando impactos ambientais e sanitários.

Carlos Silva Filho, presidente da International Solid Waste Association (ISWA), aponta que o principal entrave é a falta de investimento municipal na gestão de resíduos.

📌 Fatos preocupantes sobre o lixo no Brasil:

❌ Existem quase 2 mil lixões ainda em operação.
95% do material coletado não é reaproveitado.
A reciclagem ainda é baixa, pois a matéria-prima reciclada é tributada duas vezes.

A cobrança pelo serviço de coleta e tratamento de resíduos, essencial para garantir sua viabilidade, ainda não é uma realidade na maioria das cidades. Enquanto água, luz e telefonia são cobrados, a gestão do lixo segue sem financiamento estruturado.

De acordo com Pedro Maranhão, presidente da Abrema, muitas prefeituras não possuem recursos suficientes para manter um sistema eficiente de descarte e reaproveitamento de resíduos.

Soluções e perspectivas para o futuro

Para mudar essa realidade, o Brasil precisa:

Investir em aterros sanitários e fechar lixões a céu aberto.
Criar incentivos fiscais para empresas que utilizam biogás e recicláveis.
Expandir a infraestrutura para distribuição de biometano.
Educar a população sobre separação de resíduos e coleta seletiva.
Estimular parcerias entre setor público e privado para ampliar o aproveitamento do lixo.

O setor de resíduos tem potencial para transformar a matriz energética nacional, mas precisa de planejamento estratégico e investimentos. Um estudo do Instituto Brasileiro de Resíduos Sólidos aponta que seriam necessários R$ 60 bilhões para que o Brasil atingisse as metas do Plano Nacional de Resíduos Sólidos.

Com iniciativas como as de Fortaleza e Seropédica, o Brasil dá um passo importante na direção de um futuro mais sustentável e eficiente na gestão de resíduos. Mas ainda há um longo caminho a percorrer para que o biogás se torne uma alternativa energética viável em todo o país.

Com informações de Istoédinheiro

Zeudir Queiroz