Jaguaribara. É de perto que moradores e gestores deste município acompanham com aflição a rápida diminuição no volume do açude Castanhão. Há apenas quatro anos, a situação era bem diferente. Em 2011, o maior reservatório do Estado abria suas comportas com mais de 70% de sua capacidade hídrica. A atual marca, de 20,69%, ameaça o abastecimento de moradores circunvizinhos e a economia da cidade.
Para a sub-bacia do Médio Jaguaribe, onde esta localizado o Castanhão, a quadra chuvosa deste ano foi muito inferior à do ano passado. De acordo com os dados do Portal Hidrológico do Ceará, mantido pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) e pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), órgãos responsáveis pelo monitoramento da situação hídrica do Estado, em 2014, o total de chuvas na Bacia do Médio Jaguaribe entre os meses de fevereiro a maio foi de 479,1 mm.
Já este ano, esse acumulado ficou em 315.9 mm, ou seja, o desvio em comparação com o mesmo período do ano passado foi de -34%. O pouco que choveu já foi consumido. É o que mostram os números da evolução do volume d’água armazenada na Bacia do Médio Jaguaribe. No início do ano, o volume total era de 19% e hoje é de 19,2%. Com relação ao Castanhão, em primeiro de janeiro de 2015, mantinha 1,72 bilhões de metros cúbicos de água, o equivalente a 25,77% de sua capacidade. Hoje, seus 20,60% representam menos de 1,4 bilhões de m³.
“Nós vemos com preocupação a situação que vive hoje o Castanhão. Temos os registros de pouca chuva e a água indo embora, principalmente para Fortaleza. Não vemos uma ação de combate ao desperdício, de economia de água. Além disso, essa crise ainda há de se agravar”, alertou o prefeito de Jaguaribara, Francini Guedes.
O município, que tem pouco mais de 10 mil habitantes, vive hoje um clima de tensão com relação ao Castanhão, já que grande parte da economia local gira em torno dele, por meio da piscicultura. “Se algo não for feito de imediato, de modo a assegurar a água que ainda temos, de uma forma que ela seja utilizada de uma maneira mais consciente, Jagaribara vai parar. Hoje, pelo menos duas mil famílias vivem da piscicultura e isso vai ser um problema muito sério”, acrescentou Guedes.
Os jaguaribarenses não estão enfrentando esse problema por opção. A população teve que abandonar sua cidade em 2001 para que fosse construído o açude. O antigo local, distante cerca de 50 km de onde é a cidade hoje, permitia condições melhores de trabalho e sobrevivência. Os moradores contavam com a pesca, agricultura e com água passando na porta de casa.
“Lutamos tanto para que não acontecesse o Castanhão que agora temos que lutar para mantê-lo”, desabafou o poeta e morador de Jaguaribara Ediberto Carneiro da Silva.
No clima de incertezas, moradores que vivem ao lado do reservatório, temem o desabastecimento, realidade que já é identificada em comunidades a poucos quilômetros do açude. De acordo com o professor Xavier Silva, morador da península do Curupati, a falta de infraestrutura nos assentamentos rurais, para onde centenas de famílias foram realocadas da antiga cidade, tem prejudicado o abastecimento humano e a agricultura. “Só a chuva nos próximos anos amenizará esse problema. Os prognósticos, porém, não são animadores e por isso tememos o pior”, lamenta.
Para um dos integrantes do Movimento Atingidos Por Barragem (MAB), Édipo Oliveira, a forma como a água é distribuída hoje causa muito mais prejuízos do que benefícios para as comunidades afetadas. “A situação vivida pelos moradores de Jaguaribara requer uma reorganização popular para cobrar medidas dos governos. Comunidades ao lado do Castanhão estão sem água. Precisamos organizar a população para avançar no debate sobre para quê essa água está sendo usada e para quem”, completou Édipo.
O Castanhão, maior açude de múltiplos usos do Estado, é responsável por manter a perenização do Rio Jaguaribe (e com isso abastecer cidades ribeirinhas no seu percurso até sua foz, no Litoral Leste), bem como garantir água para a Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), servindo também para indústria e agricultura irrigada. As atenções dos beneficiados pela água do Castanhão estão voltadas para a próxima reunião do Comitê de Bacias, que será realizada entre os meses de junho e julho, quando será posta a realocação de águas para o segundo semestre deste ano.
Com a quadra chuvosa bem abaixo da média – constatados 444.3 mm dos 607.4 mm estimados para o período -, a situação de reserva hídrica do Estado do Ceará é preocupante. Ao fim da estação chuvosa deste ano, os níveis dos açudes no Ceará somam 19,6% o que significa 38,7% a menos de acúmulo de água do que no mesmo período de 2014, quando, após os meses de chuva, as reservas ficaram em torno de 34%.
Quadro crítico
Dentre as Bacias, o quadro mais crítico é a do Baixo Jaguaribe com 1,3% da sua capacidade normal. Porém, ela conta com os açudes Castanhão e Orós, que ajudam no abastecimento de muitos municípios. As bacias do Sertão Central e de Crateús também inspiram preocupação. A bacia do Banabuiú acumula apenas 4,27% enquanto a do Sertões de Crateús 4,68% da sua capacidade.
ENQUETE
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“Lutamos tanto para que não acontecesse a construção do Açude Castanhão, destruindo a antiga cidade de Jaguaribara, que agora temos que lutar para mantê-lo funcionando, com água”
Edilberto Carneiro
Poeta
“É bastante preocupante a situação atual. Comunidades ao lado do Castanhão estão sem água. Precisamos organizar a população para avançar no debate sobre para quê essa água está sendo usada e para quem?”
Édipo Oliveira
Integrante do MAB
“Se algo não for feito de imediato, de modo a assegurar a água que ainda temos, de uma forma que ela seja usada de maneira mais consciente, não tenho a menor dúvida de que Jaguaribara vai parar”
Francini Guedes
Prefeito de Jaguaribara
Mais informações
Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme)
Avenida Rui Barbosa, 1246, Aldeota – Fortaleza (CE)
Fone: (85) 3101-1088
Ellen Freitas
Colaboradora
Fonte: Diário do Nordeste
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