Fortaleza. Ontem foi dia de mobilização nacional dos prefeitos. No Estado, a Associação dos Municípios do Ceará (Aprece) liderou a manifestação. Segundo a entidade, os cofres públicos das Prefeituras cearenses, assim como no restante do País, estão à beira de um colapso financeiro. A entidade aponta que o problema decorre do baixo repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), se comparado à quantidade de despesas das gestões municipais nos vários segmentos de serviços prestados à população, como nos setores de educação e a saúde.
De acordo com o presidente em exercício da Aprece e prefeito de Piquet Carneiro, Expedito José do Nascimento, a ideia central da mobilização é alertar a população sobre o problema, e sensibilizar parlamentares federais cearenses para a necessidade da celeridade na aprovação das Propostas de Emendas Constitucionais (PECs) que aumentem o FPM em 2%, em cima dos 23,5% recebidos atualmente.
“Os municípios estão fragmentados, perdendo receita. O nosso maior problema é com o FPM. O governo federal adotou, em 2008, uma série de políticas macroecômicas que comprometeram a base de cálculo do FPM”, diz Expedito José, destacando que, com o aumento em 2%, os municípios receberão cerca de R$ 367,6 milhões.
Ele afirma ainda que o cenário financeiro atual compromete a melhoria de serviços essenciais, como a saúde e a educação. Disse que, por conta do déficit, os municípios têm ano a ano aumentado também suas despesas com pessoal. Segundo o presidente, a mobilização chegará em Brasília durante a 17ª Marcha dos Prefeitos, de 12 a 15 de maio próximo. “Vamos sensibilizar as bancadas competentes de cada Estado para nossa causa. Conversar com deputados federais, estaduais e senadores “.
A mobilização faz parte da campanha “Viva o seu Município”, coordenada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM) em parceria com a Aprece e demais entidades estaduais.
Sem recursos
A crise financeira que atinge as administrações municipais vem se agravando nos últimos quatro anos. O resultado é o desequilíbrio fiscal. As pequenas cidades do Nordeste, que integram a ampla maioria das unidades da federação, são afetadas. Faltam recursos para adequada manutenção e funcionamento de postos de saúde, creches, escolas, hospitais e outras unidades de saúde.
A situação se agravou para os novos gestores que herdaram dívidas e uma máquina administrativa sucateada e muitas vezes ‘inchada’ com servidores concursados e estáveis. “As transferência de recursos do governo federal e do Estado só dá para a folha de pagamento do funcionalismo, contribuição previdenciária e o que sobra para a limpeza”, disse o prefeito de Icó, Jaime Júnior. Os prefeitos são cobrados diariamente por melhoria nos serviços básicos e construção de obras. Sem dinheiro no caixa, as Prefeituras estão paralisadas.
Ontem, dia de mobilização, não houve no Interior do Estado fechamento de algumas sedes administrativas, mas os gestores reafirmam que o quadro é de dificuldades crescentes. “O maior problema é a manutenção de serviços públicos de educação e saúde”, disse o prefeito de Iguatu, Aderilo Alcântara. “Os governos enviam recursos para as obras, mas as Prefeituras têm de arcar com a maior parcela das despesas de manutenção”.
Citou como exemplo a Unidade de Pronto Atendimento (UPA), inaugurada recentemente, cujo contrato de parceria prevê contrapartida de 25% das despesas com o município. Segundo ele, manter UPA, Policlínica, creches e outros serviços têm sido um fardo mais pesado. Os gestores de cidades pequenas reclamam ainda mais. “Não há como ter receita própria e dependemos de transferências de recursos estaduais e municipais, que são insuficientes”, disse o prefeito de Cedro, Nilson Diniz. O prefeito de Várzea Alegre, Vanderlei Freire, disse que assumiu o município com expectativa de realizar muitas obras e ampliar os serviços. “A realidade mostra que dependemos de recursos do governo para investimentos”.
Na maioria das Prefeituras do Sertão Central não houve adesão ao movimento promovido pela Aprece, apesar das dificuldades enfrentadas pelos gestores municipais. Entretanto, em Quixadá, após o atendimento da população no período da manhã, o prefeito João Hudson Bezerra determinou a paralisação de todas as secretarias, com exceção dos serviços essenciais.
No Maciço de Baturité, muitas Prefeituras também não aderiram ao ato promovido pela Aprece, apesar de estarem enfrentando problemas, principalmente nas áreas da educação e da saúde. Todavia, em Itapiúna, todas as Secretarias do Município não abriram as portas.
Transição
As Prefeituras dos maiores municípios dos Sertões dos Inhamuns não aderiram à paralisação organizada pela Aprece e CNM. Funcionaram normalmente ontem. De acordo com a Prefeitura de Crateús, não houve adesão pela gestão porque o novo prefeito, Mauro Soares, assumiu nos últimos dias, após a renúncia do prefeito Carlos Felipe. Por isso, a gestão se encontra em fase de adaptação e transição.
“A gestão se encontra em fase de transição, não sendo adequado paralisar, por isso não ocorreu a adesão”, explicou a chefe de gabinete, Ana Isabel Bonfim.
Em meio ao debate sobre a redução de recursos para os municípios, o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenador do Observatório de Políticas Públicas, Fernando Pires, questiona os casos recorrentes de desvio de verbas públicas por alguns gestores.
“A partir da Constituição Federal de 1988 houve descentralização de recursos para os municípios e com regularidade lemos notícias sobre desvio de verbas, enriquecimento ilícito, casos denunciados pelo Ministério Público e Tribunal de Contas”, frisou. “Essa reclamação dos gestores é antiga e devemos perguntar: mais dinheiro para quê?”
O economista e consultor da Aprece, Irineu Carvalho, demonstra que houve, a partir de 2012, um elevado descompasso entre receitas e despesas, em decorrência do aumento do salário mínimo e do piso do magistério. Embora concorde com a crise financeira, Carvalho observa que as administrações devem ter uma melhor gestão e em particular reduzir gastos com pessoal. “Em agosto passado, 110 municípios tinham despesa de pessoal acima de 51% e isso compromete a receita corrente líquida”.
Denise Nunes
Honório Barbosa
Repórteres
Diário do Nordeste
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