A necessidade de atender às demandas de uma ampla base de apoio obriga as gestões em diferentes esferas de governo a ampliar espaços na administração para acomodar aliados, tornando difícil a manutenção de uma máquina pública enxuta. No Governo Federal, são 39 ministérios, enquanto o Governo do Estado conta com 20 secretarias. Para facilitar a indicação de lideranças que o apoiaram na campanha, o governador Camilo Santana chegou a transformar quatro órgãos apenas vinculados em pastas com orçamento próprio.
Nas gestões municipais, o cenário é semelhante. A ausência de critérios técnicos para a formação de secretarias na organização administrativa de prefeituras do Interior faz com que a quantidade de pastas ativas nos menores municípios do Estado seja quase a mesma de grandes colégios eleitorais.
Num cenário de limitações orçamentárias em que se discute a necessidade de se reduzir o tamanho da máquina pública, a realidade cearense denuncia que algumas gestões seguem caminhos opostos.
A criação de secretarias em pequenos municípios cearenses diverge de estratégias adotadas até no âmbito da Prefeitura de Fortaleza e do Governo do Estado, chamando atenção para a falta de organização administrativa mais planejada para gerir os poucos recursos disponíveis.
Despesas
Os municípios de Baixio e Ererê têm quantidades aproximadas de seis a sete mil habitantes e ambos compõem a lista das menores cidades cearenses. De acordo com o portal da transparência do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), os gastos em 2014 das duas gestões alcançaram R$ 15,3 milhões cada. A diferença é que a Prefeitura de Ererê dividiu as despesas entre sete secretarias, enquanto a Prefeitura de Baixio precisou distribuir o orçamento em 12 pastas.
A Prefeitura de Baixio conta com uma estrutura para a manutenção de uma Secretaria de Transportes, órgão inexistente até na organização administrativa de Fortaleza. A gestão do Município também mantém uma Secretaria com orçamento próprio voltada exclusivamente para assegurar políticas públicas para a Juventude, pasta incomum na composição da maioria das gestões do Interior do Estado.
A Prefeitura de Granjeiro, apesar de gerir um Município com cerca de 4,5 mil habitantes, conta com um número de secretarias superior à quantidade adotada pelas gestões de Itapipoca e Maranguape. A organização administrativa é dividida em 12 secretarias e, assim como na maioria das cidades cearenses, é possível constatar excessos. A estrutura do Governo do Estado, por exemplo, uniu as pastas da Agricultura e da Pesca, mas as duas áreas contam em Granjeiro com secretarias específicas.
Para Matias Pereira, especialista em administração pública da Universidade de Brasília (UnB), o cenário reflete uma realidade nacional em que os gestores estão muito mais preocupados com a sobrevivência política no momento da organização administrativa do que com a formação de uma estrutura que os ajudem a fazer uma boa gestão.
Restrição
“Na administração pública, toda vez que você tem que adotar medidas de restrição, enfrenta enormes dificuldades com seus aliados e com toda a estrutura que está se beneficiando daquelas distorções. Esses dirigentes não têm nenhum compromisso com uma boa gestão. Eles estão trabalhando para manter um status quo e para sobreviver politicamente”, detalha.
Matias Pereira ressalta que, do ponto de vista da gestão pública, manter grande número de secretarias sem levar em consideração o tamanho do município não tem sentido, mas destaca que a influência do patrimonialismo na política brasileira justifica essa realidade.
“O público e o privado se confundem. Uma Prefeitura pequena com uma infinidade de secretarias que, no seu conjunto, acaba pesando no orçamento é algo, do ponto de vista da gestão pública, irracional e sem sentido. Mas é nessa situação que você abriga seus aliados, cabos eleitorais, parentes”, salienta.
O especialista em administração pública analisa o impacto na qualidade dos serviços públicos prestados na medida que a organização da estrutura administrativa é prejudicada. “Quando se tem uma secretaria inchada, na verdade é um cabide de empregos, um local de acomodação de servidores. Quando tem uma situação dessa, acaba não tendo condições de devolver serviços de qualidade à população, porque a maioria é despreparada, não tem condição de estar no serviço público”, avalia.
Travada
O professor acrescenta que a desorganização administrativa não é exclusividade de gestões de pequeno e médio porte e destaca que a influência política também afeta a estruturação de grandes governos. “O Brasil tem 39 ministérios e a gestão pública está totalmente travada. É um Estado inchado com cargos em comissão alocados apenas pelo critério política. Há a necessidade de a sociedade e de essas populações se organizarem no sentido de se posicionar contra esses gestores”, completa.
No universo dos dez maiores colégios eleitorais, o número de secretarias varia de seis a 23 pastas, sem levar em consideração a estrutura de gabinete do prefeito ou do vice e excluindo entidades, assessorias, fundações, institutos e autarquias ligadas à gestão. Enquanto a Prefeitura de Maranguape, responsável por gerir um Município com aproximadamente 122 mil habitantes, é dividida em seis secretarias, o orçamento de Iguatu, com cerca de 100 mil moradores, tem que ser distribuído por até 17 pastas.
Em Maranguape, a gestão decidiu organizar a estrutura administrativa dividida em Secretaria de Administração e Finanças, Secretaria de Educação, Secretaria de Saúde, Secretaria de Infraestrutura, Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social e Secretaria do Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Agrário. No ano passado, o Município gastou aproximadamente R$ 146 milhões.
Já em Iguatu, entre as 17 pastas, a estrutura da Prefeitura conta com Secretaria do Trânsito e Cidadania, Secretaria da Comunicação, Secretaria da Gestão e Secretaria da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Em 2014, o Município informou ao Tribunal de Contas dos Municípios despesas na ordem de aproximadamente R$ 159 milhões.
Alan Barros
Repórter
Fonte: Diário do Nordeste
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