Um padre belga suspeito de abusar sexualmente de crianças e adolescentes assistidos pela instituição beneficente que ele mantinha, em Caucaia, foi alvo de mandados de busca e apreensão do Ministério Público Federal (MPF). A operação aconteceu na manhã de ontem, em três endereços, sendo um em Fortaleza e dois em Caucaia. Agentes da Delegacia de Defesa Institucional (Delint) da Polícia Federal, acompanhados de um adido da Bélgica, apreenderam material considerado suspeito.
O padre da Congregação Sagrado Coração de Jesus (SCJ) já foi investigado em Bruxelas, nos anos 1970 por pedofilia, conforme o MPF. “Ele foi investigado na Bélgica junto com outro padre de lá, que mora atualmente em Salvador e é capelão de um colégio católico. Os dois foram para Bruxelas, em 2010, durante novas investigações, mas o crime havia prescrito e acabaram liberados para retornar ao Brasil”, afirmou Lívia Maia de Sousa, procuradora da República responsável pela investigação.
Em Caucaia, o sacerdote fundou uma instituição que atende crianças e adolescentes carentes, chamada Sítio Esperança da Criança, que funcionou clandestinamente durante 10 anos, de 2003 até 2013, quando fechou definitivamente, segundo a PF.
De acordo com informações do MPF, desde 2010 quando as investigações começaram no Ceará, vários meninos entre 9 e 12 anos disseram ter sido abusados sexualmente por ele. No entanto, alguns mudaram o depoimento e chegaram a desmentir o que já haviam dito.
Por conta do recuo das supostas vítimas e das testemunhas em suas declarações, as denúncias feitas anteriormente não foram esclarecidas. As investigações nunca concluíram de fato se o crime foi praticado ou não.
A delegada federal Juliana Pacheco, titular da Delint, disse que existe uma dificuldade para comprovar os abusos, em função das ajudas, inclusive financeira, que o padre dava às supostas vítimas. “Ele é suspeito de aliciamento direto. Já tinha sido alvo de outras investigações que foram arquivadas. Infelizmente, é muito difícil confirmar alguma coisa apenas com depoimentos, porque as pessoas que eram atendidas precisavam da ajuda financeira que ele fornecia em nome da instituição e são gratas pelo que receberam. Ouvimos depoimentos que dizem que ele é uma pessoa maravilhosa, uma espécie de santo. Só as investigações podem dizer quem ele é realmente”, disse a delegada.
Conforme Juliana Pacheco, desta vez, o material colhido no local deve ajudar no andamento das apurações. Segundo ela, algumas situações consideradas atípicas encontradas durante a operação também serão analisadas pelas autoridades.
“Encontramos no sítio de Caucaia dois rapazes que já são maiores de idade, mas moram lá com o padre desde que tinham 12 anos, exatamente a faixa-etária das supostas vítimas. Outra coisa que nos intrigou é que os três imóveis visitados foram comprados com dinheiro dele, mas as duas casas foram doadas a pessoas que trabalharam no sítio. Queremos saber por quê”.
A delegada disse ainda, que o padre tem histórico de denúncias de pedofilia. “As pessoas que dizem ter sido aliciadas por ele contam histórias muito parecidas, independentemente de onde os supostos abusos aconteceram, na Bélgica, Rio de Janeiro ou Ceará. Ontem, apreendemos material que foi encaminhado para a perícia, que contêm indícios de provas da ocorrência do crime aqui no Estado”.
‘Cálice’
Conforme o MPF, as investigações começaram no Ceará quando a ‘Operação Cálice’ foi deflagrada na Bélgica. Diversos padres foram investigados por pedofilia e o nome deste sacerdote surgiu novamente. O Tribunal de Primeira Instância da Bélgica descobriu que ele trabalhava diretamente com crianças, em Caucaia, e pediu que o MPF investigasse a conduta do padre aqui. Foi então que surgiram as várias versões de abusos, que passaram a ser apuradas.
Segundo o MPF, o vigário já foi ouvido mais de uma vez e nega qualquer envolvimento com pedofilia. Ele diz que sua única intenção era ajudar e nunca aliciou nenhum dos meninos que assistia no sítio.
Ordenado no ano de 1965, o padre investigado não é autorizado a celebrar missas no Ceará, conforme apurou a Polícia Federal. Ele teria sido proibido pela Congregação a qual pertence. Conforme o MPF, documentos da Igreja Católica que faziam parte de uma investigação feita no Vaticano, foram violados. Algumas das páginas que sumiram citariam o padre belga.
Em novembro de 2014, o então vigário-geral da SCJ, em Roma, John van den Hengel revelou que o padre suspeito dos abusos estava passando por um processo de expulsão, por ter se recusado a atender ordens da Igreja, que incluiam encerrar as atividades da instituição de caridade e se mudar para o Sul do Brasil.
A reportagem tentou contato com a SJC, mas as ligações feitas não foram atendidas.
FIQUE POR DENTRO
Papa intensifica combate à pedofilia no clero
O papa Francisco assumiu o pontificado no ano de 2013, durante escândalos de pedofilia na Igreja. Ele tem feito do combate aos abusos sexuais a crianças e adolescentes, cometidos por religiosos, uma de suas principais bandeiras. O papa diz que os crimes “deixam marcas profundíssimas” e, “se forem cometidos por um sacerdote que têm como missão unir o homem a Deus, são ainda mais graves”. Por assumir que as vítimas de pedofilia feitas pelo clero são inúmeras, Francisco autorizou diversas ações para coibir o crime. Em junho de 2015, deu um passo decisivo e autorizou a criação de um tribunal no Vaticano para apurar casos de abusos sexual de crianças e adolescentes, cometidos por sacerdotes. Com isto, o Vaticano poderá apurar e punir casos de reverendos que não foram investigados ou punidos em suas dioceses. O tribunal também poderá penalizar bispos, que comprovadamente tenham encoberto crimes de padres.
Fonte: http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/
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