As consequências da prolongada estiagem no Estado são realmente muito graves. Poucos têm a exata dimensão do quadro existente no Interior cearense e as perspectivas mais sombrias ainda para um futuro não muito distante, caso atrase, mais uma vez, a conclusão das obras de Transposição de Águas do Rio São Francisco.
O Ceará, hoje, tem apenas um terço da água que armazenou em passado recente, concentrado em um pequeno universo do seu território, deixando exposto a necessidades e humilhação um contingente populacional enorme, dependente do carro-pipa para receber um pouco do líquido necessário à sua mais premente necessidade.
Alguns dos nossos representantes têm tratado da questão, porém, com discursos político-eleitoreiros, e consequentemente vazios, portanto, sem repercussão junto ao Governo Federal, do qual, pelo estado de calamidade vivido, somos todos dependentes de sua disposição de concluir a obra de transposição, a única capaz de socorrer os cearenses e milhares de outros nordestinos sedentos por água.
A mais recente promessa é de que ela estará pronta no fim de 2015, o ano do centenário da seca responsável pela morte de uma multidão de conterrâneos e tão bem retratada por Rachel de Queiroz.
Pressionado
Como os outros anúncios de conclusão da obra não foram cumpridas, o noticiário que dá conta de ela estar sendo atacada mais celeremente não nos estimula a acreditar venha a ser realmente concluída na nova data.
O certo é que, mesmo acelerada, não se justifica a tibieza da bancada federal, composta de três senadores e 21 deputados federais (o 22º é da oposição, Raimundo Gomes de Matos), e demais lideranças políticas locais, em não ter pressionado o Governo Federal a concluir a obra nos prazos anteriores, para evitar chegarmos ao triste quadro atual.
Relato do Ministério da Integração Nacional dá conta de já ter sido feito 67,3% das obras de transposição no trecho que “vai da captação do rio São Francisco, no município de Cabrobró (PE), até o reservatório de Jati, em Jati (CE).
Em outro trecho, também no Ceará, só tem 26,3% da obra executada, de Jati até o reservatório de Boi II, no município de Brejo Santo. Pelo exemplo do que foi feito até aqui, não é preciso ser cético para duvidar que tenhamos água do São Francisco no Ceará em 2015.
Em anos normais de inverno, o Ceará tem condições de acumular até um total de 18,8 bilhões de metros cúbicos de água. Um terço disso é só do Castanhão, o nosso maior reservatório.
Restante
Hoje, nos 149 açudes monitorados pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos, órgão do Governo estadual, temos apenas 5,6 bilhões. Essa água está concentrada, praticamente, na área dos Açudes Castanhão e Orós, pouco mais de 70% do total, ficando as demais regiões do Estado com o restante.
É por isso que populações de 106 municípios cearenses dependem do carro-pipa para satisfação de suas mínimas necessidades, um quadro vergonhoso em pleno século XXI. O Exército brasileiro coordena a distribuição de água nessas localidades com um total de 1028 carros. E a Defesa Civil do Estado atende a outros tantos moradores em áreas críticas utilizando uma frota de 56 carros-pipa, todos captando água de reservatórios distantes e parcialmente secos.
A perfuração de mais de mil poços profundos, nos últimos cinco anos, contribuiu relativamente pouco no aumento da oferta de água às populações carentes. Vários deles não responderam às expectativas de suas vazões. Ainda não temos, com a precisão necessária, as informações sobre o potencial hídrico do nosso subsolo para permitir se localizar, com sucesso, onde deva ser feita a perfuração de poços, embora seja infinitamente pequeno o número de perfuratrizes de posse da administração pública.
Pela nova ordem, agora, só serão perfurados poços onde o estudo justificar o investimento. E serão as prefeituras ou quem se dirigir ao Estado pedindo um poço o responsável pelo estudo geofísico do solo, o que por certo reduzirá o desperdício do trabalho de escavação, e, óbvio, o número de poços sem utilidade.
O Estado, nos últimos anos, tem feito investimentos para permitir uma melhor convivência do nosso povo com as secas. Mas ainda falta muito para se chegar ao ponto ideal, onde o trauma da falta de chuvas seja menos agressivo a todos. O Governo Federal tem ajudado pouco. A situação de penúria do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS) mostra bem como a União continua desinteressada em fazer o Ceará e o Nordeste romperem esse quadro mais que secular de vulnerabilidade. Sequer reestruturar o órgão a nossa representação política conseguiu.
Privilegiada
Fortaleza e sua Região Metropolitana são privilegiadas quanto à oferta de água para suas populações. O Açude Castanhão garante o líquido que é distribuído pela Cagece. Até o ano passado, a contribuição saída do Castanhão representava 80% de toda a água por ele liberada. Neste ano ela chegou a 100%. O maior açude do Estado tem capacidade para armazenar 6,7 bilhões de metros cúbicos. Hoje, acomoda apenas 2,3 bilhões, o correspondente a 36%.
Edison Silva
Editor de política
Fonte: Diário do Nordeste
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