Docente investigado pela Operação Santana Raptor não teve seu nome divulgado. Delegado disse que é um ‘professor de ponta’ na área de estudos de fósseis. UFRJ disse que ‘todos os fósseis sob sua guarda estão legalmente cadastrados’.
Um professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), investigado em operação da Polícia Federal que apura o tráfico de fósseis na Região da Chapada do Araripe, realizava pagamentos mensais a operários de pedreiras para obter fósseis ilegalmente, afirmou o delegado da Polícia Federal, Alan Robson Alexandrino Ramos nesta quinta-feira (22). A PF não divulgou o nome do docente alvo da Operação Santana Raptor.
“É um professor de ponta, [especializado] no estudo científico em torno dos fósseis. Os ‘peixeiros’ e os atravessadores tinham contato constante com ele, e o professor financiava mensalmente alguns investigados. [Quando se acha algum fóssil], o procedimento correto é contatar a Agência Nacional de Mineração [para informar] que houve um achado fóssil. Em vez de fazer isso, o ‘peixeiro’ ou trabalhador das minas era cooptado”, afirmou o delegado em entrevista coletiva.
Além das mensalidades, os investigados recebiam pagamento pelas peças encontradas. “Hoje, um dos investigados confirmou que recebia, em dinheiro, pagamento por peça”, disse o delegado.
Em nota, a UFRJ afirmou que repudia a denúncia de uma mensalidade para obter os fósseis. “Todo pagamento efetuado a operários de pedreiras foi fruto de processo com completo amparo legal”, diz a universidade.
Investigações do Ministério Público Federal do Ceará (MPF) apontam que o esquema consiste na extração e comercialização ilegal de fósseis por trabalhadores de pedreiras nos municípios de Nova Olinda e Santana do Cariri, no Ceará. Fósseis são bens da União e integram o patrimônio cultural e natural brasileiro.
A universidade informou que “todos os fósseis sob a guarda da UFRJ estão legalmente cadastrados e catalogados na instituição e notificados aos órgãos responsáveis”.
A UFRJ comunicou ainda “que todos os docentes e a própria unidade (Instituto de Geociências) têm documento de autorização para coleta e pesquisa de fósseis na Bacia do Araripe (CE), fornecido pela Agência Nacional de Mineração (ANM)”. (Leia íntegra da nota no fim do texto).
A Operação Santana Raptor cumpriu 19 mandados de busca e apreensão, sendo 17 no Ceará e 2 no Rio de Janeiro na manhã desta quinta-feira. Durante a ação, dois homens foram presos em flagrante nos municípios de Nova Olinda e Santana do Cariri. Um deles estaria entre os principais negociadores de fósseis entre 2017 e 2020, e o segundo seria o responsável por receber valores do professor da UFRJ para coletar e guardar os fósseis.
Os detidos foram encaminhados ao Sistema Penitenciário e estão à disposição da Polícia Federal. Já o material apreendido será analisado por peritos.
No Rio, os mandados de busca e apreensão foram cumpridos no gabinete e na casa do professor da UFRJ.
Segundo a polícia, os materiais fósseis encontrados vão ser avaliado por peritos. “Estamos apurando se esse material encontrado no local é legal ou oriundo de contrabando”, disse o delegado.
As investigações do MPF apontaram a atuação de uma rede de empresários, servidores públicos e atravessadores que negociam fósseis raros da região, com indícios da prática ilícita por parte do professor da UFRJ e de outros pesquisadores nacionais e estrangeiros.
Caso os crimes sejam comprovados, os investigados vão responder pelos crimes de organização criminosa, usurpação de bem da União e crimes ambientais, e podem ser condenados a penas de até 16 anos de prisão.
O trabalho, coordenado pelo procurador da República em Juazeiro do Norte, Rafael Ribeiro Rayol, teve início após o Ministério Público Federal ser comunicado sobre a comercialização ilegal de fósseis. “Estamos de quatro a cinco anos fazendo essa investigação, que começou através da comunicação de uma pessoa que informou que estava ocorrendo essa comercialização de fósseis na região.
Durante esse período, foram apreendidos dois fósseis de pterossauro, considerado raro por ser específico da região.
“Aqui no Brasil eles são vendidos por um preço bem inferior. Já na Europa, eles valem milhares de euros. Inclusive, descobrimos [em operação anterior] um fóssil de pterossauro que estava sendo oferecido na França por 150 mil dólares”, afirmou Rayol.
Investigações do MPF apontam que os fósseis da Região da Chapada do Araripe eram comercializados no Brasil e na França, Holanda, Japão, Itália, entre outros.
Conforme o procurador, já foram feitas três ações de combate ao tráfico de fósseis desde 2015. Uma delas resultou na descoberta de um lote de 46 fósseis de pterossauros e de outros animais que habitaram o território brasileiro há mais de 100 milhões de anos e que foram levados de forma ilegal para a França. O material apreendido está em processo de repatriação para retornar ao Brasil.
Investigação
A Operação Santana Raptor foi batizada com este nome em referência ao gênero de dinossauro encontrado na região da Chapada do Araripe, onde são encontradas riquezas fossilificas de 110 milhões de anos.
Confira íntegra da nota da UFRJ:
Na manhã desta quinta-feira, 22/10, a Polícia Federal (PF) fez incursão no Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN) da UFRJ para procedimento de mandado acerca da suspeita de um professor estar envolvido com contrabando de fósseis.
A Decania do CCMN e a Reitoria da UFRJ esclarecem que toda documentação solicitada pela PF foi entregue. Lamentavelmente, a UFRJ não foi procurada antes em nenhum momento para prestar esclarecimentos. Destacamos que todos os fósseis sob a guarda da UFRJ estão legalmente cadastrados e catalogados na instituição e notificados aos órgãos responsáveis. Além disso, todos os docentes e a própria unidade (Instituto de Geociências) têm documento de autorização para coleta e pesquisa de fósseis na Bacia do Araripe (CE), fornecido pela Agência Nacional de Mineração (ANM), uma autarquia federal ligada ao Ministério de Minas e Energia (MME), responsável pelo gerenciamento da atividade de mineração e dos recursos minerais do país.
Salientamos que toda atividade de pesquisa em campo é previamente notificada à ANM, através do sistema de Controle da Pesquisa Paleontológica (Copal), assim como o relatório de pós-atividade é também inserido nesta plataforma. Até 2018, a referida agência mantinha um escritório regional no Cariri (CE), responsável pelo acompanhamento dos estudos e coletas na região. Desta forma, todas as ações dos pesquisadores da UFRJ, nesta área de estudo, sempre foram notificadas ao responsável pelo escritório regional, Sr. Jose Artur Ferreira Gomes de Andrade, que fazia todo o acompanhamento em campo.
Totalmente comprometida com os princípios éticos que balizam a administração pública – legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência –, a UFRJ aguarda as investigações, com a convicção de que os fatos serão devidamente elucidados.
Fonte: https://g1.globo.com/ce
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