Isto É: O retorno dos jogos de azar

Depois de 75 anos de proibição, parlamentares manobram para reabrir cassinos
Até o começo dos anos 1940, o Rio de Janeiro figurava como um dos destinos mundiais para apostadores. Os prestigiados cassinos da então capital do Brasil eram usados para reuniões políticas, recepções a convidados estrangeiros e até shows exclusivos, como os que Carmen Miranda fez no fim daquela década no antigo Cassino da Urca. No entanto, três meses depois de chegar à presidência, em 1946, Eurico Gaspar Dutra, apoiado pelo Congresso e por boa parte da imprensa, assinou um decreto proibindo os jogos de azar no país. No texto, dizia que a “tradição moral, jurídica e religiosa” dos brasileiros era incompatível com eles. Mais do que isso, afirmava que “povos cultos” não toleravam esse tipo de prática. A lei vigorou por 75 anos, mas agora está perto de ser mudada — e por força de atores políticos relevantes, como o presidente da Câmara, Arthur Lira, o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, e o senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro. Hoje, ao menos cinco projetos tramitam no parlamento em torno da legalização dos jogos no País. O mais relevante deles é o que deu origem a um grupo de trabalho na Câmara, criado por Lira, para colocar em votação ainda no mês que vem um projeto (PL 442/1991) arquivado há cinco anos. Se aprovado, tornará legal todos os tipos de jogatinas — de cassinos a bingos. Em paralelo, tramitam no Senado duas propostas semelhantes: uma de Nogueira, que também libera todos os jogos, e que já foi reprovada, em 2018, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), mas voltará à pauta, e outra do senador Irajá Abreu, que pretende abrir o mercado apenas para cassinos que funcionem dentro de resorts turísticos. Seu plano original é que cada estado tenha apenas um único complexo desse tipo. A pauta, no entanto, trouxe à tona conflitos internos no Palácio do Planalto. De um lado estão os evangélicos, que se posicionam fortemente contra qualquer mudança na lei. Eles são apoiados por parte da ala militar do governo e ainda se amparam na posição do Ministério Público Federal, que já deixou claro ser contrário aos projetos. Os argumentos são contundentes: a volta dos jogos seria uma nova oportunidade para o crime organizado lavar dinheiro e traficar drogas, além do problema do vício. De outro lado estão ministros como Paulo Guedes, da Economia, e Gilson Machado, do Turismo, além de Flávio — que liderou uma comitiva a Las Vegas (EUA), em setembro de 2020, para conhecer alguns dos cassinos mais opulentos da cidade. Apesar de não manifestar sua posição, Bolsonaro gosta da ideia da volta dos cassinos. “Ele é favorável. É que precisa dar satisfações para a bancada evangélica”, conta o advogado Paulo Melo. Ele trabalhou como assessor da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, até meados deste ano e, como ela, atua para impedir a legalização. Há outros interesses sendo manejados: enquanto parte do governo quer a legalização total dos jogos, outra parte, inclusive Flávio, defende a proposta dos resorts integrados — modelo ao qual foi apresentado pelo bilionário americano Sheldon Adelson, em Las Vegas. Um dos principais apoiadores de Donald Trump, o empresário morreu em janeiro, aos 87 anos, com os olhos voltados para o Brasil. A mudança na lei será resultado de todas essas disputas de forças. “O grande desafio é definir regras claras para o setor”, diz Magno José, do Instituto Jogo Legal. Fonte: https://bnldata.com.br/  
Zeudir Queiroz

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