Após um ano de discussões desde sua criação, o Conselho Empresarial do Brics definiu propostas para o desenvolvimento da competitividade das empresas dos países membros e, entre elas, estão a troca direta de moedas e a facilitação do visto para empresários dentro do grupo. Um documento contendo estas e outras propostas será entregue hoje, em Fortaleza, aos cinco chefes de Estado que estarão presentes no VI Cúpula do Fórum Brics.
De acordo com o presidente do Conselho Empresarial do Brics no Brasil, José Rubens de la Rosa, a troca direta de moedas é uma das principais solicitações dos empresários presentes no chamado “Annual Report” do conselho, pois reduziria consideravelmente os custos das transações comerciais entre os países membros (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). “Com isso, por exemplo, se eu precisar fazer uma remessa financeira à Índia, não precisarei mais ter que trocar o real por dólar e então trocar por rupias. Com a troca direta, há um ganho de dinheiro, o custo da transação fica menor”, aponta. Essa troca direta, informa, poderá ser feita pelo banco de desenvolvimento que deverá ter sua criação consolidada nesta terça-feira no encontro dos chefes de Estado.
Padronização técnica
Segundo Rubens de la Rosa, que é o CEO da Marcopolo, o documento propõe ainda uma harmonização dos padrões técnicos de cada país. Ele citou o fato de, muitas vezes, os produtos brasileiros sofrerem com uma concorrência desleal com produtos chineses, que não seguem as mesmas regras técnicas de fabricação que os nacionais precisam ter para serem aqui comercializados. A ideia é que sejam criadas normas que serão reguladas e gerais para todos os países do grupo nas transações de exportação e importação.
“Queremos que as empresa brasileiras possam competir no mesmo ambiente, em condição de igualdade, com produtos de empresas de fora, que deverão atender às mesmas especificações”, analisa.
Cooperação
O Conselho Empresarial do Brics foi estabelecido em março do ano passado, durante a V Cúpula do Fórum Brics, em Durban, África do Sul. Ele congrega 25 empresas, sendo cinco de cada país integrante do grupo. Do lado do Brasil, estão as empresas Marcopolo, Gerdau, Banco do Brasil, Vale e WEG. Conforme Rubens, houve, durante este ano, a dificuldade de coordenar os anseios de cada país, uma vez que cada um tem o interesse de que seus produtos sejam vendidos nos demais.
“Mas vimos que há negócios que podem ser feitos em conjunto, tanto entre estes cinco países, como em terceiros”, destaca, citando a possibilidade de formação de parcerias entre empresas dos países membros para executar projetos de infraestrutura em um outro de fora do grupo de emergentes. Das áreas de interesse, no caso do Brasil, ele apontou a oferta de tecnologias em energias renováveis, por exemplo. A partir de então, ele diz que será feito um maior detalhamento destas zonas de interesse. “Cooperação é a palavra certa para que se possa gerar negócios de cada lado”, defende.
De la Rosa frisou, todavia, a preocupação de que não haja importação de mão de obra estrangeira quando da entrada de investimentos de outros países. “Isso não podemos aceitar”.
Banco de desenvolvimento
O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga, destacou a importância para o setor industrial da consolidação do banco de desenvolvimento dos Brics.
“Hoje, é difícil para uma empresa investir lá fora com recursos próprios. Com o banco, será possível financiar esses investimentos”, considera. Ele também chamou a atenção para a necessidade de redução na burocracia para o investimento entre estes países. Perguntado sobre o que achava da possibilidade de entrada da Argentina dentro do grupo do Brics, ele refutou a ideia. “O conceito do Brics não é um conceito onde a Argentina se encaixe”, defendeu. Conforme disse, o grupo preza pela segurança jurídica e pela “busca de uma democracia plena”, o que, diz, afastariam a Argentina.
Braga destacou ainda que a exportação brasileira para os países do grupo é de US$ 54 bilhões, sendo que 80% deste valor é de produtos primários. “Queremos mais manufaturados na exportação”, reforça. O câmbio, o custo do dinheiro no Brasil, a alta carga tributária, entretanto, dificultam o comércio internacional para a indústria. “Desta forma, não da pra se ter um preço competitivo”, fala.
Indústria local defende ampliação da mecanização
Será preciso ampliar a mecanização das fábricas, reduzindo o número de empregadores nas mesmas, para que a indústria cearense e brasileira se tornem competitivas no mercado internacional. O posicionamento é do presidente da Federação das Indústria do Estado do Ceará (Fiec), Roberto Macedo, que participou ontem da reunião de grupos de trabalho do Conselho Empresarial do Brics. Segundo ele, mesmo entre o grupo de países em desenvolvimento, o Brasil está em desvantagem competitiva e é preciso realizar mudanças que reduzam o valor dos produtos manufaturados produzidos aqui.
“No caso do Ceará, por exemplo, temos pouquíssimos produtos manufaturados exportados. Nós temos aqui no Estado a energia mais cara do País, sem contar que, assim como no resto do Brasil, o custo da mão de obra é caro e as regras existentes aqui dificultam a entrada de empresas no mercado internacional”, afirma.
“É necessária a mecanização, não só no Ceará como em todo o Brasil. Vamos ter que investir em máquinas e reduzir os empregos nas fábricas. Há uma falta de profissionalismo muito grande. As pessoas trocam muito de empresas, e assim a indústria sofre de descontinuidade”, explica. O presidente da Fiec, contudo, pondera: “eu não quero desemprego, mas quero mais emprego com mais empresas. Se aumentarmos a competitividade, poderemos ter mais empresas”. Macedo defende a necessidade de se intensificar o comércio entre os países que compõem o Brics, destacando que os cinco países somam 25% do PIB mundial. (SS)
Banco de Desenvolvimento só deverá operar em 2016
Brasília. Um dos temas debatidos durante a reunião dos Brics, em Fortaleza, é o Novo Banco de Desenvolvimento. O acordo histórico para a criação da instituição e de um fundo virtual de reservas será assinado na reunião e terá ainda que ser ratificado pelos países, processo que, de acordo com a diplomacia brasileira, deverá levar um ano na melhor das hipóteses. Depois de ratificado, os países terão ainda seis meses para fazer os procedimentos orçamentários e transferir o aporte inicial de recursos para o banco.
Igualdade na distribuição do capital do banco do Brics, para um equilíbrio de forças entre os países no comando da instituição, é ponto considerado fundamental pelo governo do Brasil nas negociações finais que ocorreram nesta segunda à tarde na reunião de ministros da Fazenda e presidentes de Bancos Centrais dos países que integram o grupo. Os US$ 50 bilhões de capital inicial do banco – previstos nas negociações – deverão ser bancados igualmente pelos países – US$ 10 bilhões cada um. Desse total, US$ 8 bilhões serão em garantias e US$ 2 bilhões em dinheiro. O aporte total levará sete anos para ser concluído integralmente. Enquanto o ato para a criação do fundo virtual anticrise, que recebeu o nome de Acordo Contingente de Reservas, está praticamente fechado, ainda estão pendentes detalhes mais políticos do banco, como a definição e o local da sede.
O Brasil deverá ser escolhido o primeiro presidente e a cidade chinesa de Xangai, a sede do banco. A presidência será rotativa. O presidente terá mandato de cinco anos, não renováveis. O país que for escolhido como sede será o último da sequência para a indicação da presidência.
Comando
O Brasil quer a presidência, porque considera estratégica essa posição para a definição do seu modelo de atuação. Como regra geral, o banco vai aprovar empréstimos para países membros do grupo, abrindo a possibilidade do conselho de administração aprovar financiamentos para não membros. Segundo fontes envolvidas nas negociações, a nova instituição terá um mandato bastante aberto para usar diversos instrumentos de financiamento. Os objetivos, porém, serão restritos, porque será um banco de projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável. O banco poderá tanto fornecer empréstimos, quanto garantias e participação no equity (capital) dos empreendimentos.
Estrutura
Ao contrário do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, a ideia é que o banco do Brics tenha uma estrutura enxuta com “cara” de empresa. Um conselho de governadores, que será formado pelos ministros, dará as diretrizes estratégicas e tomará as decisões principais. O Conselho de Administração, num nível abaixo dos ministros, fará a supervisão da implementação das diretrizes. A criação do fundo e do banco tem importância estratégica para os países como instrumento adicional para a rede de proteção dos países, formada pelos organismos multilaterais como o Fundo Monetário Internacional e o Bird. O fundo virtual receberá US$ 100 bilhões – 41% pela China, 18% pelo Brasil, Índia e Rússia e 5% pela África do Sul.
Integração efetiva é reivindicada
Os empresários brasileiros, russos, indianos, chineses e sul-africanos querem integração efetiva e a derrubada de barreiras não convencionais existentes entre os países do Brics para comércio e investimentos. Em documento que será entregue aos presidentes do grupo hoje (15), os líderes do setor privado também pedem maior facilidade para que bancos dos países do grupo se instalem nos demais membros do bloco, para financiar exportações e investimentos e aceleração do banco do bloco.
Entre as barreiras não convencionais, estão, as dificuldades para que a receita federal russa realize o desembaraço de produtos, sem que haja uma regra clara, ou as frequentes indecisões dos portos chineses em acelerar a entrada de bens e mercadorias no país asiático.
“O Brasil não vai permitir a compra de terras por estrangeiros, nem a China abrirá mão de deter pelo menos 51% de qualquer empreendimento estrangeiro lá, por exemplo, mas questões que hoje diminuem o ímpeto das exportações entre nós podem ser derrubadas com força política de cada líder em seus países”, disse um empresário de uma grande companhia de commodities, presente ontem no primeiro dia de reunião dos Brics.
Aduana
Outro empresário, do ramo de alimentos, afirmou que a entrada de seus produtos na Rússia depende do sinal verde de “alguns poucos” funcionários da alfândega, e que a negociação não é simples.
Na relação com a Índia, o discurso dos empresários aos governantes é que “existe aparente pouca organização” quando o assunto é a entrada de produtos estrangeiros.
Sérgio de Sousa
Repórter
Fonte: Diário do Nordeste
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